segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Quando se está caçando...

(Ler antes ou depois Urubus )



... de pouco se lembra e de muito se atém. Há sempre uma face em sua mente e apenas um par de olhos que você deseja ver. A face é a ultima que você viu; a de seu pai e os olhos, são de quem verá os seus pela ultima vez; a caça.

É daqueles que precisa que comece a chover para fazer.

Boca rasgava o resto da bochecha; por dentro comia carne viva e ainda pulsando; por fora uma fenda que escavava o chão. Aguardava o momento para um golpe final – seria o primeiro em muito tempo, mas lhe ensinaram bem.
Seus olhos já escurecidos por completo denunciavam, não havia mais espaço para a salvação. A fenda da boca era seca e muda como um rasgo no deserto. As fendas dos olhos eram tão profundas quanto poças que gritavam.
Um dia já havia sido alguém para se seguir. Um dia já havia ocupado um lugar de referência, mas deslizes. Nada é tão condenável quando o objetivo é tão cruel.

Daqueles que ainda não sabe o que o cheiro do fogo lembra.

Vermelhos e estirados. Do músculo do antebraço ao tendão da perna. Havia se acostumado a andar sobre quatro apoios...
... observar aquela criatura de longe era de gelar a espinha. Fazia com que todos os órgãos daquele que o caçava, se comprimissem em 10cm dentro do seu corpo. Como havia ficado daquela forma? Ouvira dizer que já tinha sido o melhor, mas agora... Agora a cor que exalava do seu corpo cheirava estrume, carniça.
O que podia ser um problema; se sentia o cheiro dali, a criatura com certeza, como um bom caçador que fora, também poderia farejá-lo. Preocupante. Melhor ficar contra o vento.

Ele é daqueles que pergunta já sabendo.

Quando a noite caiu, só podia identificar onde a criatura estava pelo brilho escuro de seus olhos, que desnecessariamente refletia a lua, ou pelo cheiro podre de carniça. No fundo, graças a deus.
Que o deserto era vivo ele sabia. Mas que era cruel ao ponto desumanizar daquela forma, era inimaginável.
Já havia estado sozinho em grandes florestas, no meio do oceano... Só por isso foi escolhido para o resgate. Mas não podia imaginar que o deserto pudesse ser tão diferente. Uma vez isolado e completamente a deriva, sabia que se aceitasse e jogasse o que a natureza propusesse, ela o aceitaria como um organismo vivo e integrante. Sempre eram necessários sacrifícios de ordem corporal e mental, mas geralmente a natureza se compadecia... Agora, ao olhar aquele vestígio de homem, andando sobre as juntas dos dedos, duvidava que houvesse qualquer tipo de compadecimento naquele lugar.

Daquele que espera ser vencido gentilmente.


(continua?)
Barbara

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