sexta-feira, 2 de agosto de 2013

Riso seco

- Encontrei tudo seco, nada estava mais como eu me lembrava. Da última vez que estive ali tudo ainda florescia, tudo estava cheio e repleto d’água, e nenhuma daquelas construções estava de pé. Tinha ouvido falar, claro, que seriam feitas, mas até ai, tudo demora tanto tempo que não pensei... Quando cheguei nem ao menos lembrei que poderiam estar ali, pensei... Inocentemente, que tudo estaria como da última vez que estive. Desvendei o que há muito me incomodava, que me tirava o sono; tudo estava seco, árido, de um nu cravado. De um nu que me chegou a doer os olhos. Fazia muito tempo que nada fluía em mim. Nada, brotava dos meus dedos, olhava, olhava, olhava e enxergava, sempre enxerguei bem, mas mesmo assim, via e não conseguia incorporar mais. Nada dava mais liga em mim, tudo o que tentava agregar a mim continuava heterogêneo, e eu não sabia porquê. Descobri. Eu estava seco, árido, não tinha como nada ter liga. Faz tempo sim. Claro, sempre soube que algo estava errado, mas não encontrava o que, tive que parar e ir até lá para ver com os meus próprios olhos; quase sem vegetação, quanto tempo devia estar sem chover, sem umidificar a pele? Molhei dois dedos na boca e finquei na terra, por um breve momento pensei que não aconteceria nada, mas logo tudo estremeceu, como num prazer morfológico tudo estremeceu e pude sentir, ou imaginei no mínimo, uma fonte em algum lugar começando a gotejar. Quis fazer de novo, lambi meus dedos e os enterrei na terra novamente, dessa vez com mais força, novamente ela estremeceu, senti meu corpo aquecer levemente, por quem sabe um raio de sol que começara a encontrar caminho entre a cortina espessa de nuvens, ao longe imaginei a fonte correr num fio mais contínuo. Queria ter permanecido ali pelo tempo que fosse para conseguir fazer tudo germinar e florescer de novo, era um prazer. Não muito altruísta não. Confesso que também me estremecia o corpo fazer aquilo tudo estremecer, e também precisava fazer as coisas voltarem a correr em mim ao passo que enquanto aquilo estivesse em plena secura estancada, nada aconteceria. Eu queria ter continuado, mas não pude. Tudo era seco demais, meus dedos estavam muito cheios de terra, e ao voltá-los para dentro de meus lábios, a saliva toda secara, precisaria de muito mais para reavivar aquela terra. Agora aqui, iludo-me em pensar que só de já tê-la visitado já seja o suficiente para fazer voltar tudo fluir, sei que não. Não sinto vontade de parar de falar sobre, tenho medo de esquecer ou de passar a ser menos importante. Agora que vi como tudo está, não posso mais seguir sem uma culpa dominar-me os ossos. Não vejo como eu poderia ser responsável pela seca, mas uma vez consciente, uma vez tendo sido eu a fazer um pequeno fio correr novamente na pele enrugada. Sinto-me apaixonado por tal bestialidade, que provavelmente vai acabar comigo se continuar assim. Lembrei que quando havia chego ali na última vez, tinham me dito que documentos e remédios ficavam na mesma gaveta, talvez fosse uma questão de cultura local mesmo.
-          - Cultura, né?

-          - É, loucura.



Barbara

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