quarta-feira, 17 de abril de 2013

Barbara fala

Na verdade, há um episódio em minha vida, que ainda está estupidamente mal resolvido. Não que falar sobre ele aqui, publicamente, vá resolver alguma coisa, mas prefiro seguir minhas intuições – elas têm se mostrado muito mais eficazes do que qualquer outro raciocínio.

Existe uma autora da qual eu gosto muito, aliás, li quase todos os seus livros – com exceção de um, que estrategicamente me mantive distante por hora – e um feliz acaso do destino, fez com que sua biografia fosse lançada no cinema há um tempo. Nada mais justo do que assisti-la, comprar o DVD e elegê-la como um dos meus – seis – filmes favoritos.

Até então, tudo se desenrola de uma forma racionalmente lógica e esperada.

No filme, minha querida autora recebe uma indicação de leitura, e não só a lê, mas torna-se um livro determinante em sua vida. Com o tempo, eu, espectadora da espectadora, vou ficando com este detalhe na cabeça. Decido que quero lê-lo, anoto seu titulo e autor, e despreocupadamente vou a sua busca.

Não encontro.

Esgotado em todos os lugares. Tenho o desejo de lê-lo, mas também não me abalo muito. Passam-se dois anos sem encontrá-lo em nenhuma língua ou tradução que fosse. Não entendo porque, não é um livro desconhecido, mas sim publicado e lido consideravelmente, até aqui no Brasil.

Havia virado rotina entrar em um sebo e perguntar, antes de mais nada ou antes de tudo, pelo próprio. Ninguém fazia menção de conhecê-lo.

Até que um dia marquei de ir ao cinema – na Augusta – com uma amiga.

Cheguei antes, claro.

Olhei para o outro lado da rua e reparei naquele “pseudo boulevard” logo na mesma altura que o cinema. Minha intuição indicou para ir dar uma volta, e eu obedientemente a segui. Não gostei de nada.

Avistei por fim um sebo e pensei, pra quê entrar num sebo agora? Não preciso comprar nada, pelo amor de deus, vou sair com dez livros daí, vou ter que ficar carregando... Intuição manda e não pede, e eu já aprendi; obedeço e não questiono.

Começo a minha via sacra: “Oi, você por acaso tem “A Vida nos Bosques” do Henry Thoreau?”, já olhando em volta para continuar minha jornada, porém recebo uma resposta diferente: “Não, não tenho. Mas eu queria muito também”. Como assim queria muito também? Uma pessoa em carne e osso que sabia da existência do livro? Mantive-me calada e ele seguiu: “Mas sabe, eu tenho um amigo que estava falando alguma coisa sobre isso... Espera, aqui.”. E assim ele me deu um cartão de outro sebo que ficava dois quarteirões para baixo dali. Fui.

Não me entendi. Por que meu coração está acelerado? É pela ansiedade da negativa quando chegar, ou porque de fato estava descendo correndo a Augusta?

Chego ao sebo. Vamos para via sacra. “É, eu comprei”, “Você o que?”, “Eu comprei. Rolou uma coisa esquisita semana passada, a L&PM Pocket lançou algumas edições antigas e eu comprei ali na banca da Paulista, perto do Belas Artes”. Dessa vez, eu subi correndo.

O que aconteceu foi que cheguei à banca, havia um ultimo exemplar e eu o comprei, doentemente.

Não tive coragem de ler a contracapa, o índice, a ultima frase, nada. Coloquei-o na estante.

O caso não é este.

O caso é que um mês depois, tornei a ver o filme e me deparei com uma situação... Sem adjetivos para descrevê-la: O livro que a minha, querida, autora Jane Austen lê na sua vida, não era “A Vida nos Bosques” como eu tanto já havia constatado e depois de muito tempo procurado, mas sim “A história de Tom Jones” de Henry Fielding.

“A Vida nos Bosques” não é citado em nenhum momento no filme, eu nunca ouvi falar deste livro, a não ser na minha memória sobre o filme. Desconhecia completamente o autor... Ou seja, passei dois anos da minha vida, procurando um livro que nunca ouvi falar, que nunca ninguém me indicou. E agora que faz um ano que o comprei, nunca o li. Ele permanece em minha estante.

Está ai uma situação que não sei como proceder. Porque como muitos sabem, coragem não me falta, mas se tem uma coisa de que sei bem: É que só podemos ler um livro quando ele canta para nós.

Este livro cantou para mim, incessantemente, durante anos. Agora está calado.

Não sei quando cantará. E também, não sei que dança vou dançar quando ele começar.


Barbara

Um comentário:

  1. Acontecem coisas estranhas na vida, Barbara.
    Você, assim como eu, só encontra uma maneira de falar sobre isso: descrevendo sem rodeios ou floreios ou teorias - e simplesmente esperando que o leitor acredite. Não há nada além disso a ser feito.

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