Havia dito que não espirraria. Não sabia porquê ele continuava
insistindo
- Já chega, não é mesmo? – Disse ela batendo na blusa para tirar
o pó de alcaçuz e iogurte que começava a grudar na lã.
- Não, eu tenho certeza que você é alérgica a alguma coisa. Deve
ser algo simples... – Ele continuava andando de um lado para o outro.
- Não, eu já disse. Não tenho nenhuma dessas coisas com “ite”!
Aliás, não entendo o que você está pensando... – Ela pegou a prancheta da
grama. – Couro vencido, leite qualhado, bolas de gude, bolas de meia, que por
sinal eu preferia que não tivessem sido usadas. Doces, cabelo ruivo, que você
até agora não me disse de quem eram. Fitas cassetes, mu... mu-gaal...?
- Museu! Minha letra não está tão ruim assim vai. – Ele estava com
as mãos na cintura, inspecionando a grama, como se algo tivesse passado
despercebido. – É, museus. O que já elimina pintura a óleo, madeira antiga,
conservantes, cera para polir e guardas exagerados.
- Por que eu seria alérgica a guardas exagerados?
- Por que você não seria,
deveria ser a questão. Todo mundo é.
Ela só queria entender o porquê de tudo aquilo. Que coisa! Nunca ninguém
ligara para esse fato. Muito pelo contrário, ela lembrava-se muito bem da mãe e
da tia Ivone exclamando graças a deus a saúde dessa menina ser de ferro. Já
bastava a delas serem mais instáveis que do que leite fervendo, virgem Maria...
Oras, havia entendido que aquilo era bom!
Vai ver ele queria que ela desse
trabalho, ou pelo menos não colaborasse... É, podia ser isso mesmo. Lá vem
ele com uma folha seca, pensou ela, vou tentar.
- Cheire essa! Peguei do alto daquela árvore, o que já elimina
todas as outras folhas.
Ela tomou a folha da mão dele, olhou de longe como quem parece
desconfiado e a atirou para longe.
- Não! – Ele correu para tentar apanhá-la. Acabou caindo alguns
metros abaixo, mas salvou a folha sem deixa-la encostar no chão. – Por que você
fez isso? Era para você cheirá-la!
- Mas eu não quero.
- Mas, mas, mas eu achei... – Ele baixou os olhos, e as mãos caíram
sobre a grama.
- Pois achou errado, eu não quero. – E virou dramaticamente, dando
tempo dele ver apenas seu cabelo, e não a sua expressão de dúvida.
- Ah, ta bom então. – E saiu cabisbaixo.
Ela não entendeu. Espiou por cima do ombro, e o viu sentando perto
do lado. Oras, achei que era o que ele queria; se fazer de difícil, dar trabalho...
Mas ele nem insistira!
O que será que aconteceu? Ele se perguntava. Já estávamos fazendo
isso desde de manhã, não sabia que ela não estava gostando. Só queria ajudar...
Achava que as pessoas gostavam quando demonstrávamos interesses por suas
fraquezas. Mas ela não tinha nada! Como ia fazer? Que confuso, não sabia onde
havia errado.
Será que ela ficou com nojo da roupa encardida? Mas como ela
esperava que ele apanhasse aquela folha, sem se sujar?
Ela foi até ele, e sem que percebesse, abaixou até encostar o
nariz na folha que ele ainda segurava, como houvesse esquecido das mãos.
- Também não sou alérgica a essa aqui. – E o olhou timidamente.
Ele a olhou espantado e abriu um sorriso que fez desaparecer suas
orelhas.
- Muito bem! Tenho o ultimo teste! Vamos!
Enquanto corriam, ela pensava se não havia entendido mal sua mãe e
a tia Ivone. Porque se ter saúde era se sentir bem, ela não estava tão bem
assim; havia algo que toda vez que pensava dava um negocio no estômago, faltava
o ar, e a fazia sentir uma coisa... Ainda mais quando ele segurava assim sua
mão.
- Chegamos! – Encontravam-se em frente a uma caixa de correio
esverdeada. – Cheire essa.
Ele abaixou perto da caixa e esperou ela abaixar também. Depois de mais uma inspirada, nada novamente aconteceu. O olhar dele de desapontamento veio e a cabeça pendeu sobre o pescoço.
Ele abaixou perto da caixa e esperou ela abaixar também. Depois de mais uma inspirada, nada novamente aconteceu. O olhar dele de desapontamento veio e a cabeça pendeu sobre o pescoço.
Ela decidiu acabar de vez com aquela dúvida!
Inclinou a cabeça bem para baixo a fim de alcançar os lábios do
amigo. E alcançou-lhes com sucesso, apertou bem forte até os olhos dele se
abrirem e arregalarem. Depois disso, ela espirrou.
- Achamos. Você é alérgica a mim. – Disse ele fingindo felicidade.
- Achamos. Você é alérgica a mim. – Disse ele fingindo felicidade.
- Pode ser... – Mas como quem não se importa, um segundo beijo não
tão apertado veio, interrompido por outro espirro claro, mas eles não se
importavam, pois veio o quarto, o quinto...
Barbara
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